sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Circo da notícia


Há jornalistas loucos para fazer papel de policiais
por Carlos Brickmann

Um famoso marginal carioca, Lúcio Flávio Villar Lírio, que virou até herói de filme, costumava protestar duramente contra a corrupção policial. Queixava-se: "Polícia é Polícia, bandido é bandido". Pouco depois, na pior fase da ditadura militar, uma das reivindicações da imprensa era proteger-se contra o exercício da profissão por policiais que se faziam passar por jornalistas. A luta para que Polícia e jornalismo não se misturassem teve grandes vitórias. Agora, infelizmente, vemos muitos jornalistas loucos para desempenhar funções policiais.
Há coisas visíveis, como fantasiar-se de policial para obter imagens exclusivas. E coisas menos visíveis, como os jornalistas que levam e trazem informações da Polícia, sem sequer se dar ao trabalho de checá-las; como os repórteres que, em vez de publicar as notícias que obtiveram, preferem entregá-las às autoridades.
Há jornalistas que, nos anos de chumbo, valorizavam o direito de defesa, colocavam-se a favor do respeito aos direitos humanos, mantinham-se sempre perto de um advogado (até porque, em certos momentos, só a ação firme deste advogado poderia mantê-lo vivo, incólume e em lugar conhecido). Hoje criticam "os advogados pagos a peso de ouro" – os mesmos que, no passado, os defenderam de graça – e criticam os direitos individuais. A seu ver, uma Polícia que não seja atrabiliária, uma investigação que não ofenda os direitos humanos e a possibilidade de acesso dos advogados à acusação, para que possam preparar a defesa, atrasam a punição dos culpados. Defendem a execração pública dos investigados, sem qualquer julgamento. Repetem, quase com as mesmas palavras, o refrão da direita fascista: direitos humanos são coisa de bandido. E bandido, naturalmente, é quem eles consideram bandido, e que o juiz só terá o direito de condenar. Ai do juiz que tiver idéias próprias e absolver algum cavalheiro que a imprensa considera culpado! Será patrulhado e atingido por toda sorte de insinuações.
Parafraseando Júlio Mesquita, em sua histórica polêmica com Eduardo Prado, isso não é imprensa, ou melhor, imprensa não é isso.


Trecho de artigo originalmente publicado no Observatório da Imprensa.

Carlos Brickmann: é jornalista, consultor de comunicação e especialista em gerenciamento de crises.

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