terça-feira, 8 de julho de 2008

Desrespeito à Lei Seca: Crime ou Infração Administrativa?


Por Sânio Eduardo Fontes de Aquino.

A estatística da tragédia: cerca de 35 mil mortes por ano, 400 mil feridos, 1,5 milhão de acidentes e R$ 22 bilhões por ano só para cobrir gastos com desastres em estradas federais. São os números que deram origem a uma política de tolerância zero, instituída com a lei 11.705/08 – a Lei Seca.
O primeiro alerta: admitir o raciocínio de “política zero” em relação vertical – da Administração para com os administrados – é admitir ofensa ao princípio da razoabilidade, também orientador dos atos de Estado. Nada razoável, por exemplo, a imposição de prisão em flagrante àquele que se encontrar com quantidade irrisória de álcool no sangue. Já há registro de prisão por simples ingestão de dois bombons de licor(!).
Evidente a necessidade de se evitar mortes no trânsito, mas a máquina administrativa não deve se distanciar de ponderações que permitam a individualização das infrações e conseqüentes sanções ou medidas coercitivas de controle.
Lembro às autoridades de trânsito e aos defensores da política de não tolerância que a Lei de Trânsito (art. 165) impõe que o condutor de veículo esteja “sob influência de álcool ou substância psicoativa” para ser enquadrado nesse dispositivo. Em outro ponto (art. 276, parágrafo único), a mesma lei impõe que um “órgão do Poder Executivo federal disciplinará as margens de tolerância casos específicos”.
Portanto, razão não há para que um cidadão seja encarcerado e seu veículo apreendido. Não se pode falar em multa, nem tão pouco em prisão. Insisto, não há necessidade de que uma terceira pessoa seja nomeada para dirigir o veículo cujo condutor original tenha usado apenas anti-séptico bucal (como aconteceu em rodovia federal no Estado de São Paulo na semana passada). Eis o abuso: o álcool, nesse caso, está apenas no hálito, não em quantidade suficiente para alterar as funções orgânicas de um motorista. E a razoabilidade?
Invoco elementos do Direito Penal para deixar claro ao amigo leitor, há garantias que não podem ser desconsideradas, sob pena de ocorrer o caos e a balbúrdia. Para que ocorra um crime – o que justificaria uma restrição à liberdade individual – deve haver ofensa concreta a um bem jurídico protegido por lei. Ora, condução anormal ou “barberagem” não é crime, pelo menos por enquanto. Só posso concluir pelo abuso que há em interpretar a lei 11.705 de forma “seca”.
Que fique claro: estar embriagado, mas sem perturbar a segurança, não é crime. Não se pode falar em prisão em flagrante para essa hipótese. Por outro lado, ao volante, o sujeito sofrerá conseqüências administrativas do Código de Trânsito Brasileiro, tais como multa, suspensão da habilitação, porém, não deverá ser preso em flagrante, não terá que pagar fiança. Infração administrativa é uma coisa, crime é outra – bem diferente.


Reprodução do texto autorizada pelo autor, desde que citada a fonte.
Imagem:http://www.cisa.org.br

2 comentários:

  1. Coibir os abusos de ambas as partes, fiscalizar com isenção, beber com prudência, são tantas as questões. Espero q o imbroglio jurídico seja brevemente esclarecido. Enquanto isso, o que vemos é a redução do número de atendimentos de acidentados nas emergências públicas. É fato que motoristas alcoolizados já mataram ou incapacitaram muita gente. Assim como um número grande de controladores são facilmente subornados. É, companheiro Edu, há muito o q debater...

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  2. Não se pode controlar o consumo de bebidas alcoólicas, uma vez que não se pode controlar o próprio ser humano e sua consciência. Isso é particular de cada um e não há lei pra isso. Há sim uma diminuição nos acidentes de trânsito, mas não é isso que faz com que os motoristas 'parem de beber'. Gostei muito de seus argumetos Edu e concordo com muitos deles. Usei alguns para desenvolviento de uma redação e tenho certeza de que vou me sair bem! Obrigada desde já pela atenção. Abraços.

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Agradeço o interesse e espero mesmo por sua impressão.
Obrigado.

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